O terceiro setor, formado por associações e entidades sem fins lucrativos, inclusive organizações não governamentais e organizações da sociedade civil de interesse público, desempenha um papel vital na sociedade, promovendo causas sociais, culturais e ambientais, que muitas vezes não recebem a devida atenção do setor público ou mesmo privado.
Essas organizações são conhecidas pela sua atuação em áreas como educação, saúde, direitos humanos e sustentabilidade. No entanto, as relações de trabalho no terceiro setor trazem desafios únicos, principalmente devido à sua dependência de financiamento externo, como doações, parcerias e incentivos públicos.
Por conseguinte, para além da mão-de-obra de cunho voluntário, para conseguir cumprir com as respectivas demandas e a “conta fechar”, as entidades se utilizam da contratação de prestadores de serviços via Microempreendedor Individual (MEI).
Certo é que o MEI permite que profissionais autônomos se regularizem, com custos reduzidos de tributos, proporcionando flexibilidade para ambas as partes. Entretanto, essa prática pode ser um campo minado de riscos jurídicos e trabalhistas para o terceiro setor.
Entre os principais riscos da contratação do MEI está o fenômeno da “pejotização”, por meio do qual o prestador de serviços, embora contratado como pessoa jurídica, na prática exerce atividades cotidianas características de uma relação de emprego, tais como a subordinação, habitualidade, pessoalidade e onerosidade, nos termos do art. 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Nesses casos, a Justiça do Trabalho pode reverter o contrato de MEI e reconhecer a relação como empregatícia, gerando passivos trabalhistas para a organização.
Outro ponto a considerar é que a contratação via MEI pode impactar a segurança do trabalhador. Sem os direitos garantidos por um contrato CLT, como férias remuneradas, 13º salário e FGTS, o profissional fica mais vulnerável. Isso pode contradizer os valores que muitas entidades defendem, como a promoção da dignidade e do bem-estar social.
Por outro lado, é importante reconhecer que as ONGs enfrentam limitações financeiras significativas, o que pode justificar a busca por alternativas menos onerosas como o MEI. No entanto, a sustentabilidade dessas práticas deve ser avaliada sob a ótica de longo prazo, equilibrando eficiência financeira com conformidade jurídica e ética.
Em suma, as relações de trabalho no terceiro setor demandam atenção e responsabilidade. A prática de contratação via MEI deve ser analisada com cautela, garantindo que não se prejudique o profissional nem a integridade da organização. Fortalecer o diálogo entre as entidades, trabalhadores e especialistas jurídicos pode ser o caminho para alinhar os princípios das organizações com práticas trabalhistas justas e sustentáveis.