Fantástico recorda investigação que terminou com a prisão de Robinho no Brasil. Especialista explica que os homens precisam se colocar no centro desse debate.
Por Fantástico
24/03/2024 22h38
Disponível em: https://g1.globo.com/fantastico/noticia/2024/03/24/prisao-de-robinho-e-fianca-de-daniel-alves-geram-debate-sobre-cultura-do-estupro-e-machismo-no-futebol.ghtml?utm_source=whatsapp&utm_medium=share-bar-mobile&utm_campaign=materias
Robinho cumpre neste domingo (24) o terceiro dia de prisão. Nesta semana, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu pelo placar de 9 a 2 que o ex-jogador, condenado por estupro na Itália, cumpra a pena de 9 anos aqui no Brasil.
Lá foram três julgamentos e não havia mais recurso possível. A decisão repercutiu na Itália, local do crime.
“Os juízes brasileiros demonstraram grande inteligência e grande independência. Portanto, consideramos que, ao menos no que diz respeito a Robinho, a Justiça foi feita”, diz o advogado da vítima, Jacopo Gnocchi.
Os casos dele e de Daniel Alves, outro ex-jogador da Seleção, são exemplos extremos de uma cultura machista e abusiva ainda muito presente no futebol. A cada oito minutos uma mulher é estuprada no Brasil.
A presidente do Palmeiras, Leila Pereira, que está chefiando a delegação da Seleção Brasileira na Europa, se posicionou sobre os casos envolvendo estupros praticados por jogadores de futebol
“Nesse caso do Daniel Alves, é um tapa na cara de todas nós mulheres. Não estamos falando de um processo, mas de uma condenação”, diz.
Ela ressalta que há preconceito, falta de oportunidade e discriminação contra mulheres no meio do futebol. Um levantamento feito com 209 jogadoras que disputam o campeonato brasileiro apontou que a maioria delas já sofreu algum tipo de assédio moral ou sexual.
Para tentar mudar essa realidade, o Bahia lançou uma campanha contra a “cultura do estupro”. O Vasco tem promovido palestras com atletas do time profissional e fez uma parceria para que a conscientização atinja também crianças e jovens que estão ainda nas categorias de base.
Um dos exemplos abordados nas palestras foi quando a jornalista Júlia Guimarães, do Sportv, foi importunada em uma cobertura.
“Foi tentativa do beijo, mas não teve o toque. E talvez para aqueles meninos, ali naquele momento, não tenha sido uma importunação, mas foi. Se mulher, não consentiu com aquilo, ela se esquivo, então isso representa uma posição de não aceitação”, diz Clarissa Arteiro, diretora de responsabiidade social do Vasco.
Quem se dedica a combater a violência contra a mulher acredita que uma medida é fundamental: a manifestação masculina.
“Eu sempre faço um desafio aos meninos e adultos: se eles já conversaram sobre o que as mulheres da vida deles já sofreram de violência. E é muito normal ninguém nunca ter discutido sobre isso. Quando a gente entende que esse problema é nosso e está na nossa volta, a gente passa a entender que a gente tem de ser parte da solução”, diz o pesquisador de masculinidades Marcelo Correia.
Jogadores da Seleção que estão na delegação chefiada por Leila também falaram sobre o tema, como o lateral Danilo. “Está na hora de a gente entender que o nosso papel é sim jogar futebol, mas é também servir de exemplo de comportamento e de forma de lidar também fora de campo para a juventude”, disse.
O crime de Robinho e as investigações
O Fantástico deste domingo relembra como foi o crime, ocorrido em janeiro de 2013 e como as investigações mostraram a participação do ex-jogador, Ricardo Falco (também condenado a 9 anos) e outros quatro brasileiros em um estupro coletivo contra uma jovem, dentro de uma boate em Milão.
Para confirmar a denúncia, a polícia italiana grampeou telefones dos envolvidos e botou uma escuta no carro do jogador.
Em uma das conversas, Robinho fala com Jairo dos Santos, músico que fazia show no local no dia do crime. Ele não teve participação na agressão sexual.
“A polícia não pode me fazer nada porque, se necessário, direi que estava lá contigo e depois fui para casa”, diz Robinho.
Jairo responde: “Mas você também transou com a garota?”
Robinho diz: “Não, não. Eu só tentei”
Jairo: “Eu te vi fazendo sexo oral com a moça”
“Isso não significa transar”, alega Robinho.
Condenado na Justiça italiana, livre no Brasil
Robinho deixou o Mila em 2014, antes do primeiro julgamento. Em 2020, chegou a assinar com o Santos, quando já havia sido condenado. Parte da torcida e patrocinadores pressionaram o clube e a contratação foi cancelada.
Desde então, mesmo condenado, Robinho gozava de liberdade, já que estava no Brasil e a lei não permite a extradição de brasileiros para o exterior.
“Não dá para simplesmente a gente fingir que não e falar, mas ele jogava muito ele era legal, Mas ele é um estuprador”, diz Livia Gonçalves Mgalhães, professora do Instituto de História da Universidade Federal Fluminense.
No mesmo dia do julgamento de Robinho no STJ, um juiz espanhol decidiu que Daniel Alves – preso e condenado em primeira instância pelo crime de agressão sexual – poderia esperar o recurso em liberdade se pagasse uma fiança de 1 milhão de euros e entregasse os passaportes.
“A repercussão principal era de que a Justiça espanhola colocou um preço a ser pago para poder estuprar alguém”, diz a professora.
O destino de Robinho
Agora preso, o ex-jogador vai ficar em um dos pavilhões da Penitenciária 2 de Tremembé, no interior de São Paulo. Durante um período que pode chegar a 20 dias, ele estará sozinho em uma cela de 8 metros quadrados.
Só depois desse tempo ele vai começar a dormir com outros detentos.
Após 3 anos e 7 meses, Robinho poderá ter direito ao regime semiaberto. Mas esse tempo pode ser reduzido se ele trabalhar no presídio. A defesa do jogador pretende recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF).
“Vamos dizer que amanhã ou depois venha o Supremo e diga que não era possível fazer essa homogação. Solta-se o Robinho. Ele terá sofrido uma prisão inutilmente”, diz o advogado de Robinho, José Eduardo Alckmin.
O caso de Ricardo Falco, condenado junto com Robinho, ainda será analisado pelo STJ. Os outros quatro brasileiros envolvidos na agressão sexual não foram processados porque já tinham retornado ao Brasil quando a investigação começou e não foram localizados pela Justiça da Itália.
O advogado da vítima falou sobre como ela recebeu o desfecho do caso.
“Foi um momento muito forte porque foi como reabrir uma ferida, porque ela viu que, após 10 anos, a pessoa que a violentou foi finalmente para a prisão. Foi um momento psicologicamente muito forte, mas positivo”, diz.